domingo, 7 de março de 2010

Nem tudo que é morte é o fim

Numa decisão quase tomada, caminhou em direção ao prédio que furava o céu e era tão imponente que se mostrava merecedor de um certo respeito. Seria o ideal. Entrou pela porta brilhosa - Seria de ouro? - Seguiu pelo hall e num passo de destino certo, como haveria de ser, entrou afoita no elevador. Ninguém reparara na menina. A pertou o botão que idicava o último andar do edifício: 45°. Por alguns minutos, enquanto se encaminhava ao topo, ela pensou em como faria para chegar no terraço do grandioso arranha-céus. Buscou as escadas como se já soubesse onde chegaria. Assim foi, Ana chegara no fim da linha.
Sua vida era boa. Família boa, amigos bons e namorado bobo. Sempre conviveu bem com a bondade e a tolice, até aquele dia. Era como se comesse uma comida, preparada e escolhida por ela mesma, mas que estivesse sem sal e por preguiça não levantava nunca da cadeira para buscar o punhado que faltava para dar gosto. Sempre pedia a mãe cansada, ao irmão inquieto e por vezes insistiu para o namorado ocupado, mas nunca levantou-se de seu lugar.
Lá em cima era frio, não era fresco, era frio. A brisa vinha cruel cortar seus braços desnudos. O chão era quente do sol que se instalava no decorrer do dia. Ela resolveu olhar e perscrutar o mundo lá embaixo para saber como ele era visto de tão alto. Era, pequeno. Como a maquete do pai morto, cheia de elementos que confundiam sua visão e ao mesmo tempo tão insignificante os detalhes. Quando vivo, o pai fazia maquetes e dizia sempre que o que valia era o todo, mas para isso os detalhes deveriam ser feitos com bastante atenção - Talvez, pensava consigo mesma. Lá de cima só via o todo e Ana pensou - Então era aquilo que os detalhes formavam? Tanta preocupação ela tinha com os detalhes para que formassem aquilo?
De repente num pulo, avistou um gato que passeava pelo beiral, sem expressão de receio ou de culpa, ou de qualquer coisa que lhe fizesse estar ali, o gato passeava pela borda. Quando quis, desceu, parou e olhou para Ana. Os dois se encararam feito primeiro encontro, ela pensou no que o trouxera ali, pensou no que ficara lá em baixo, no gosto sem graça da comida e nos detalhes tão misteriosos que formavam o todo. O gato, por sua vez, cheio de vontades, desviou o olhar e sumiu pelo enorme terraço, abarrotado de fios e relevos. Restava somente ela. A brisa foi virando vento forte e cortava seu corpo cada vez com mais violência, o som dos carros foi aumentando e a ponta do arranha-céus foi sumindo voraz.
- Ana...Ana! Sacudia e chamava a filha que estava num profundo sono. Ana acordou assustada e sua mãe perguntava - está com o rosto pálido, você está bem minha filha? E a filha respondeu com voz de alívio, - foi desses sonhos pra nos acordar para a vida, mamãe.

Um comentário:

  1. um UAU pra vc! Acho q todos temos algumas vezes nas nossas vidas, sonhos como estes, para nos acordar. Faz parte do amadurecimento e do crescimento pessoal do ser humano.

    Parabéns, Mayara. Um texto lindo, sutil, leve!

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