segunda-feira, 15 de março de 2010
A última carta
Eu não quero o seu amor cruel, tão pouco o seu amor gentil, sorrindo um arreganhar-se conquistador que aos poucos faz da distância a real certeza desse encontro. Eu disse palavras e versos tão soltos aos seus ouvidos quanto o céu que eu quero pra mim, mas não me tenha mal. Perdoe-me por saber, por conhecer o perigo e aceitar correr esse risco com você, mas as damas, como eu, são frágeis demais ao encantamento de um suposto amor, meu bem. Querido, o chá esfriou, estou a horas tentando lhe avisar, prevendo o amargo que sua boca, tão frágil, experimentaria. Nem mais açúcar, nem mais erva, mas um efeito camomila para o nosso devaneio. Não me suporte. O peso de alguém que deseja o mundo, é a ilusão de segurar o que não pode carregar para si. Não vamos compartilhar do seco da minha xícara nem do amargo do chá que esfriou nas suas mãos.
Sobras e folhas velhas de árvores viscerais, esperam de nós dois uma intimação. Fomos tolos, por vezes bondosos um com o outro, mas esse amor de quem "quer bem" não se tornou Amor daquele que apostamos nossas vidas com afinco e penitência. Redescobri em mim o sangue vivo, molhado, correndo em minhas veias me avisando que a vida tem mais chão para descobrir que a nossa cavalgada a dois pode alcançar. A hora da partida foi marcada desde os nossos primeiros passos tortos, vamos assumir essa distância entre nós e deixar que ela fale por si só, é preciso desacostumar-se, desapegar-se e nos despedir.
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