domingo, 17 de outubro de 2010

Encontro dos distraíados ou O desencontro


A urgência é uma sirene tocando, insistindo aos ouvidos e te denuncia cada vez que você puxa o ar e picota a entrada dele no seu peito, fazendo mini-respirações em pequenos espaços de tempo aos quais submetemos a nossa energia. Urgente, “não há tempo a perder” e quanto mais se faz dessa ideia um lema, mais perde-se tempo. Sua vida passa a ser dividida em minutos, a urgência transforma o sentimento em uma bomba relógio que sempre explode, sempre renasce das cinzas. Uma dose alta de adrenalina que nos faz voar e cair em segundos, mas o pior de tudo é pensar quem é o condutor da história. Você, que se esconde atrás de si mesmo, que forja acidentes, que premedita cada passo e cada ferida e que chora sem surpresa dos seus finais.  
Olha-se tanto para a vida que quase não se enxerga ela, tudo vira um borrão na velocidade do veículo. A urgência não permite distração, ela seria o erro fatal. E quem somos nós quando não estamos distraídos? Olhos esbugalhados, inchados, ocupados em sofrer adiantado só para não sofrer atrasado – que diferença faz? Quem está atento não se surpreende nem se assusta, isso é virtude dos distraídos.  
Foi na distração que eu me apaixonei por um rosto que estava sempre na minha frente e eu não via. Foi por ter me perdido de mim que eu encontrei você. Tão assustada, ainda busquei urgentemente me reorganizar, me encontrar, e notei que você sumia da minha visão, lento e disforme. Mesmo mergulhada na minha urgência burra, o coração, que é o órgão menos atento do corpo, se desconcentra e se perde e eu te amava sem saber. A adrenalina viciante do “aqui e agora” virou vício e me consumia os dias, me fazia fragmentos de mim. Quis tanto comer o tempo que ele me comeu: os olhos tensos; a boca que cuspia teorias fajutas; os braços perdidos sem o abraço; o tempo me comeu para que eu morresse e renascesse nua – afinal é como se nasce: sem nada. A vida não é um encontro marcado.


Você foi o meu melhor desencontro.

5 comentários:

  1. uma história tão bonita que às vezes a gente tenta fingir que é apática, mas quem consegue lutar contra a intensidade?

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  2. uau, mas que escrita intensa, hein??
    vc tem facebook?
    estou retomando a vida internética...
    criei até um facebook:
    http://www.facebook.com/#!/profile.php?id=100001785335358
    beijo!

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  3. sofrer adiantado só para não sofrer atrasado, maldita mania! dói duas vezes.

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  4. concordo plenamente: "o coração é o órgão menos atento do corpo"

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  5. e vamos, não há outra opção, morrendo e renascendo nuas... como sempre foi.

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